A gestão da cadeia de suprimentos é um dos pilares fundamentais da economia global. No entanto, diante de um cenário cada vez mais volátil, os riscos associados a essas operações se tornam mais complexos a cada ano. Embora os profissionais do setor estejam atentos às ameaças iminentes, nem sempre é possível quantificá-las com precisão.
O recente Relatório Anual de Riscos da Everstream Analytics destacou os principais desafios que devem impactar as cadeias de suprimentos em 2025. Entre eles, um fator se sobressai como a maior preocupação: as mudanças climáticas. O aumento na frequência e intensidade de eventos extremos ameaça a infraestrutura, o transporte e a produção global, gerando impactos expressivos em diversos setores.
Mudanças climáticas: o risco mais crítico
A intensificação dos eventos climáticos extremos, especialmente as inundações, já representa um grande desafio para a logística global. Mesmo países com sistemas avançados de alerta meteorológico e infraestrutura robusta enfrentam dificuldades diante da rapidez e da magnitude de fenômenos naturais.
Um exemplo recente foi o furacão Helene, que devastou o sudoeste dos EUA em setembro de 2024. Apesar das previsões indicarem sua chegada com uma semana de antecedência, os impactos foram catastróficos: chuvas sem precedentes inundaram 16 estados, danificando pontes, estradas e ferrovias. Os prejuízos ultrapassaram US$ 11 bilhões, afetando o abastecimento de água e eletricidade e interrompendo operações essenciais, como as do Porto de Tampa, comprometendo a distribuição de insumos químicos e agrícolas.
A principal causa desse fenômeno é o aquecimento global dos oceanos, que segue quebrando recordes de temperatura ano após ano. Em 2024, as temperaturas oceânicas atingiram níveis inéditos, tendência que deve continuar nos próximos anos. Esse aquecimento intensifica a evaporação da água, elevando os níveis de umidade na atmosfera e aumentando a incidência de chuvas extremas, tempestades tropicais e inundações.
Instabilidade geopolítica com aumento do risco tarifário
As relações políticas e econômicas internacionais estão cada vez mais instáveis, devido a conflitos em andamento, crises comerciais e disputas territoriais. Em 2025, os impactos dessas crises na obtenção de insumos, na manufatura e na logística serão inevitáveis.
A guerra entre Israel e Hamas intensificou a instabilidade no Oriente Médio, tornando o Mar Vermelho um dos pontos críticos do comércio global, devido aos ataques constantes dos houthis contra embarcações na região. Mesmo com a eventual normalização do tráfego no Canal de Suez, as consequências logísticas podem se arrastar por semanas, com congestionamento portuário e atrasos na entrega de cargas.
Na Europa, a guerra na Ucrânia entra em seu terceiro ano, com 20% do território sob ocupação russa. O apoio ocidental torna-se incerto, especialmente após as eleições nos EUA, o que pode favorecer a posição russa e aprofundar as tensões comerciais e industriais na região.
No Pacífico, a crescente tensão entre China e Taiwan segue como um fator de alerta. Embora uma invasão chinesa não pareça iminente, o aumento dos exercícios e manobras militares próximos à ilha pode afetar o transporte marítimo e aéreo na região, responsável por cerca de um terço do comércio global e 40% dos produtos petrolíferos comercializados mundialmente.
Além dos riscos geopolíticos, o aumento de tarifas comerciais também é preocupante. O presidente dos EUA, Donald Trump, propôs um plano agressivo de elevação tarifária, incluindo uma tarifa global de 10% a 20%, 60% sobre importações chinesas e taxas de até 100% sobre produtos de países que adotem medidas de “desdolarização”, como Rússia, Índia e China, que buscam expandir o comércio utilizando outras moedas.
Segundo o relatório da Everstream, a recomendação é mapear as cadeias de suprimentos por país e ajustar rapidamente seus planos, a fim de ganharem uma vantagem competitiva diante de mudanças inesperadas.
Brechas para crimes cibernéticos
Mesmo com altos investimentos em cibersegurança, invasores encontram cada vez mais “backdoors” para novos ataques. Com o avanço da inteligência artificial e da computação em nuvem nas cadeias de suprimentos, novas oportunidades surgem para criminosos explorarem vulnerabilidades. A rápida expansão dos dispositivos conectados à Internet das Coisas (IoT)** e o uso persistente de protocolos de segurança obsoletos criam um terreno fértil para ataques, além de firewalls mal configurados que agravam ainda mais a situação, abrindo brechas.
No ano passado, a Everstream Analytics identificou um aumento nos ataques cibernéticos nos setores de eletrônicos e manufatura. Para 2025, a previsão é que o principal alvo sejam os fornecedores subcontratados. Criminosos exploram erros comuns de programação e falhas de segurança nessas empresas menores, utilizando métodos como phishing*, links maliciosos e falhas em conexões de software para atingir grandes corporações.
Um exemplo é o ataque à Cencora, fornecedora farmacêutica na Pensilvânia, que teve sua segurança violada no início de 2024. O incidente afetou ao menos 11 empresas farmacêuticas globais, incluindo GlaxoSmithKline, Novartis, AbbVie e Genentech, que relataram ataques de ransomware e vazamento de dados, resultando em atrasos na distribuição de medicamentos e vazamento de dados sensíveis.
Além da manufatura, setores como eletrônicos, logística e bens de consumo também enfrentam riscos elevados. Os riscos de cibersegurança nas cadeias de suprimentos estão cada vez mais direcionados às operações de compras e manufatura. Fornecedores subcontratados, frequentemente negligenciados nas avaliações de risco, são vulneráveis aos ataques que comprometem as etapas iniciais do desenvolvimento de produtos.
Enquanto a logística e o transporte sofrem ameaças cibernéticas ao longo de toda a cadeia, os provedores de logística terceirizados (3PLs) são especialmente mais vulneráveis do que portos e aeroportos de carga. O Fórum Econômico Mundial estima que as perdas financeiras globais com crimes cibernéticos alcançarão impressionantes US$ 10,5 trilhões até 2025.
Transformações na cadeia de suprimentos: escassez de minerais e repressão ao trabalho forçado
Dois outros fatores estão redefinindo a dinâmica das cadeias de suprimentos globais: as restrições ao acesso a metais e minerais raros e o endurecimento das regulamentações contra o trabalho forçado.
A restrição ao acesso a minerais essenciais, agravada por tensões geopolíticas e sanções comerciais, tem elevado os custos e dificultado a obtenção de matérias-primas para segmentos como eletrônicos e mobilidade elétrica. Medidas protecionistas e preocupações com segurança levaram diversos países a restringirem importações de metais chineses, com destaque para o aço e o alumínio, na tentativa de proteger suas indústrias metalúrgicas.
O Reino Unido proibiu a importação de alumínio da Bielorrússia, enquanto o Chile impôs tarifas antidumping sobre o aço chinês. Seguindo a mesma linha, a Turquia aplicou taxas sobre importações de aço provenientes da China, Rússia, Índia e Japão. Paralelamente, a China intensificou o controle sobre exportações de metais críticos, como antimônio, gálio e germânio, enquanto EUA e Canadá estabeleceram tarifas sobre aço e alumínio, impactando indiretamente as importações chinesas por meio do México.
Ao mesmo tempo, a crescente repressão ao trabalho forçado vem exigindo maior transparência nas cadeias de fornecimento. A preocupação com as condições de trabalho na China e a rivalidade geopolítica com os EUA levaram muitas empresas a buscarem fornecedores alternativos na Índia, no México e no Sudeste Asiático. No entanto, muitas dessas economias emergentes não possuem leis adequadas e mecanismos eficazes de fiscalização para proteger os trabalhadores, especialmente migrantes de países em desenvolvimento.
Diante desse cenário, diversos países estão fortalecendo suas regulamentações sobre trabalho forçado. Em outubro, um comitê da Câmara dos Lordes do Reino Unido alertou que o país ficou atrás dos padrões globais e recomendou uma abordagem mais alinhada à da União Europeia. No mesmo sentido, autoridades de Taiwan consideram uma emenda semelhante à Uyghur Forced Labor Prevention Act (UFLPA), legislação dos EUA que visa impedir a importação de produtos ligados ao trabalho forçado na Região Autônoma Uigur de Xinjiang, na China.
Esses desafios exigem que empresas diversifiquem fornecedores, invistam em tecnologia para garantir conformidade regulatória e aumentem a resiliência operacional. Com um número crescente de países tomando medidas rígidas contra o trabalho forçado e infantil, a pressão por práticas mais transparentes só deve aumentar.
A X5 Logistics está sempre à frente, atualizada sobre os possíveis cenários globais e notícias do comércio exterior, para buscar soluções estratégicas que atendam com a máxima eficiência às demandas de seus clientes.
*Phishing: é um tipo de ataque cibernético, aplicado com o objetivo de conseguir dados pessoais do usuário. O termo vem do inglês “fishing”, que significa “pescar”, e faz analogia a essa maneira ilegal de “fisgar” informações”.
**IoT: o termo trata de uma rede de objetos físicos interconectados, integrados por via de softwares, sensores e tecnologias, que trocam dados entre si. É o caso da Alexa, que pode ser integrada a outros dispositivos, como smartphones, tablets, TVs, relógios, câmeras, lâmpadas, termostatos.